Nosso texto da entrada de Jesus em Jerusalém faz parte do primeiro, dos três dias em que o evangelista Marcos divide os capítulos de 11 a 13 do seu evangelho. O primeiro dia é a entrada de Jesus em Jerusalém (Mc 11,1-11); no segundo dia acontece a maldição da figueira e a expulsão dos vendilhões do Templo (Mc 11,12-19); no terceiro dia, seguem-se várias controvérsias entre Jesus e os chefes do povo; e, por fim, o discurso escatológico de Jesus (Mc 11, 20-13,37).
O texto que lemos nos introduz num momento crucial da vida de Jesus, porque é em Jerusalém que ele irá consumar sua missão de dar a vida para nos salvar. É em Jerusalém que se tornarão mais forte os conflitos entre Jesus e as autoridades religiosas do povo.
Jerusalém é a cidade santa. É para ela que acorrem todas as peregrinações, onde se celebram as grandes festas. Tudo isso porque o Templo era o centro da religião judaica, nele é que eram oferecidos os sacrifícios a Deus e ao seu redor é que estavam os grandes mestres da Lei, a ensinar. Quando um judeu devoto subia a Jerusalém, aproveitava para escutar os mestres e tirar suas dúvidas sobre questões relativas à Lei.
A narração da entrada de Jesus em Jerusalém nos remete a um texto profético do Antigo Testamento: “Exulta de alegria, filha de Sião, solta gritos de júbilo, filha de Jerusalém; eis que vem a ti o teu rei, justo e vitorioso; ele é simples e vem montado num jumento, no potro de uma jumenta” (Zc 9,9).
Ao lermos esta profecia messiânica, percebemos que o próprio Jesus preparou a sua entrada, como um cumprimento das profecias a seu respeito, com plena consciência de sua missão. Assim, toda a cena da entrada de Jesus em Jerusalém, é marcada por imagens simbólicas que comunicam quem é ele e qual sua missão.
Algo bastante interessante desse texto é perceber que, boa parte dele, é ocupado pela figura do jumentinho. Percebemos, assim, que sua figura tem algo bastante significativo a nos ensinar. Na época de Jesus era oferecido a Deus a primeira cria (primogênito) de todo animal. No caso do jumento, aquele que seria oferecido, o primogênito, deveria não ter sido montado por ninguém (cf. Nm 19,2 e Dt 21,3). Nisto fica evidente que estamos diante de um fato religioso, sagrado. A entrada de Jesus em Jerusalém não é uma manifestação política ou militar. Jesus é o messias, mas não se enquadra na expectativa de muitos de sua época, que esperavam um messias guerreiro, que ia expulsar os romanos. Ele é rei e messias e veio libertar o homem do pecado, que é a raiz de todos os males.
A entrada de Jesus em Jerusalém também é marcada pela manifestação popular. Isto nos faz perceber que o povo compreendeu, no gesto de Jesus, a chegada dos tempos messiânicos e eles aclamavam a Jesus dizendo: “Hosana! Bendito o que vem em nome do Senhor!”. Unido a isto, eles também faziam, nas suas aclamações, referências a Davi e a sua descendência, pela qual, segundo as promessas feitas por Deus, viria o messias.
A chegada de Jesus ao Templo, que era o lugar principal de Jerusalém, é bastante enigmática. Ele não realiza nenhuma atividade propriamente dita, mas observa o lugar e o que acontece lá, como aquele que veio, enviado pelo Pai, para buscar os frutos da fé daquele povo, no lugar que era o centro da fé de Israel. Depois de ter feito isto, encerrando o seu primeiro dia em Jerusalém, ele sai da cidade e vai para Betânia.
No Domingo de Ramos são feitas duas proclamações do evangelho: a primeira é a do evangelho da Entrada de Jesus em Jerusalém, no inicio da procissão de ramos; e a segunda, é a da paixão de Cristo segundo Marcos (já que estamos no ano B). Desta forma, nós somos introduzidos no período da Semana Santa. A Paixão de Cristo será de novo proclamada na Sexta-feira Santa, mas será a do evangelho de João, pois este se repete todos os anos nesse mesmo dia.
Com o Domingo de Ramos entramos na Semana Santa, que terá o seu “coração” no Tríduo Pascal, onde celebraremos a paixão, morte e ressurreição de Jesus. Esse “coração”, que é o Tríduo Pascal, tem um conteúdo fundamental: o grande amor de Deus por nós! Como nos é revelado no evangelho de João: “Com efeito, de tal modo Deus amou o mundo, que lhe deu seu Filho único, para que todo o que nele crer não pereça, mas tenha a vida eterna” (Jo 3,16).
O amor que Deus manifesta na pessoa de Jesus Cristo e, de forma especial, na sua paixão e morte, é um amor apaixonado, poderíamos dizer “louco”. Supera toda lógica humana que Deus tenha se feito homem, assumindo a condenação do pecado da humanidade.
A morte de Jesus na cruz foi por nós. Esse por nós é o fato e o motivo de toda a força com que iremos celebrar a Sexta-feira Santa. Por isso, só iremos vivenciar verdadeiramente esse grande mistério de amor, se mergulharmos nesse tempo como participantes dele e não como alguém que escuta uma história que se passou.
A Liturgia nos introduz nos acontecimentos celebrados, para que possamos vivenciar como autênticos participantes, e é isso que a Igreja chama de celebrar. É por isso que, por exemplo, o evangelho lido na Sexta-feira Santa é o de João, que tem uma forma de narração com a participação da assembléia, para que os participantes possam se sentir parte dos acontecimentos.
Peçamos ao Espírito Santo que nos ajude a celebrar o Tríduo Pascal com intensidade e profundidade, acolhendo o que significa: “ele fez tudo por nós”. Só assim experimentaremos a força do amor com que Deus ama a cada um de nós, e este amor deixará de ser apenas uma idéia bonita, para ser algo que experimentamos no nosso ser. Que possamos dizer junto com São Paulo: “O amor de Cristo nos constrange, considerando que, se um só morreu por todos, logo todos morreram.” (I Cor 5,14).
Que nesta Semana Santa, cada um de nós possa se abrir para acolher o grande amor de Deus. Este acolhimento se dá na medida em que acompanhamos Jesus no seu caminho para o calvário, em espírito de fé e humildade, usando os meios: da liturgia, da Palavra de Deus e da oração. Que esses atos sejam, nesses dias, meios práticos de nos abrir ao amor de Deus.
O amor de Deus experimentado nesta Semana Santa, através dos meios que já citamos acima, será o amor com que, verdadeiramente, poderemos amar os nossos irmãos, especialmente os mais necessitados. Este amor não é o nosso amor limitado, que, conseqüentemente, nos faz amar de forma limitada. O amor de Deus em nós faz com que possamos amar os nossos irmãos com a maneira e a força de Deus.